Quem frequenta o meu blog, O Senhor Luvas, não ficará espantado ao ler que eu considero o Manuel Alves um dos novos valores da escrita em Português. Não só escreve nos meus géneros de eleição, Ficção Científica e Fantasia, mas também é versátil ao ponto de escrever livros infantis e Romances sempre com a qualidade a que estamos a habituados a ver em editoras a “serio”. Mas existe mais um outro pormenor que torna o Manuel “diferente”, ele faz parte de uma nova geração de escritores que começam cada vez mais a fazer parte da preferência dos leitores. O Manuel é o arquétipo desta nova geração, destes escritores do século vinte e um, dos escritores 2.0.
Entre os velhos
escritores e estes novos escritores 2.0 as diferenças estão nos
pormenores, porque o que os separa é isso mesmo, pormenores, mas que
fazem toda a diferença.
O que os une é claro o
gosto pela escrita. Em ambos os casos temos pessoas que querem ser
reconhecidas e apreciadas e que, de um modo geral, gostariam de viver
da escrita. Em ambos os casos o objectivo é escrever e publicar. No
fundo ambos querem exactamente o mesmo. É no caminho escolhido que
se diferenciam.
Os da “velha guarda”
acreditam que é apenas através do livro impresso que esse
reconhecimento virá, como se apenas depois de verem o seu nome
gravado a tinta na celulose a sua imortalidade estivesse assegura.
Estes “velhos do Papel” não acreditam e/ou ignoram todo um mundo
que existe para lá da realidade física.
É aqui que aparecem este escritores 2.0, para eles a edição em
papel não é uma prioridade, a questão de publicar em formato
físico é acessória. O que lhes interessa realmente é dar-se a
conhecer ao público. Estão nas redes sociais e sabem usa-las para
divulgar o seu trabalho. Vivem do “passa a palavra” (que nestes
tempos para o bem e para o mal pode ser tanto uma bênção como uma
praga). Não estão dependentes de campanhas “milionárias” de
marketing ou da falta delas para os seus livros vingarem. Dependem
(quase) única e exclusivamente de os seus leitores gostarem do seu
trabalho e iniciarem uma corrente de boas opiniões que leva a mais
leitores. Os leitores, seja em que formato seja, acabam por se
fidelizar. Neste aspecto o facto do Manuel e outros iguais serem
bastante atenciosos com os seus leitores nas redes sociais, o meio
por excelência de contacto, ainda os torna mais fieis.
O que escrevem não passa
pelo crivo dos editores que, diga-se em abono da verdade, hoje em dia
cada vez mais meros publicadores que depois de uma leitura apenas
pesam o potencial de vendas e consequente lucro de um livro (na curto
prazo, por tudo o que passe para lá das sete semanas sem vender já
é um falhanço). As qualidades literárias, seja na escrita seja nas
ideias que difundem e poderão trazer novas perspectivas (algo muito
importante na Ficção Científica, por exemplo) fica relegado para
segundo plano. (Os verdadeiro editores são um espécie em vias de
extinção, mas isso fica para outra conversa.)
É interessante notar que
alguns dos best-sellers dos nossos dias apareceram primeiro no mundo
virtual, com escritores que começaram por se auto-publicar em sites
como o Smashwords e afins e tiveram tanto sucesso que as editoras
convencionais os foram contratar (a qualidade dos mesmo não é para
aqui chamada). É também relevante que alguns deste escritores 2.0
com fama e proveito junto dos leitores já declinaram ofertas,
algumas com valores bem elevados, das editoras convencioneis,
preferindo publicar sem interferências e intermediários, o que não
deixa de ser sintomático do actual estado do mercado editorial.
Estes novos escritores
2.0 são o sintoma de uma mercado editorial doente? Acredito que sim,
pois tenho visto alguns autores de qualidade, já publicados em papel
a migrarem para o digital. As razões são variadas, mas geralmente
giram em torno do desapontamento, da desilusão ou simplesmente do
desinteresse com o “mercado do papel”.
Pelo meio temos
inevitavelmente os “híbridos”, autores que vivem em ambos as
mundos.
Claro que nem sempre
temos a sorte de termos escritores dotados como Manuel, mas não
podiam ser só pontos positivos. No meio de algumas pérolas temos
muito lixo, mas ai as coisas, mais uma vez, não diferem muito do
actual mercado editorial convencional em papel.
Estamos então perante um
novo tipo de escritor, nascido num novo mundo em que tudo é
gratuito, mas onde não há refeições grátis. Competem com as
editoras tradicionais obrigando-as a repensar o seu modelo de
negócio. Algumas vezes acabam por ir engrossar as fileiras das
editoras, outras vezes são o inimigo que lhes rouba clientes (aqui
não à leitores, é tudo negocio).
Para já não acredito
que se possa dizer que o leitor seja o vencedor. É certo que tem
mais escolha, mas porque o lixo é muito os bons escritores podem não
se ver no meio da porcaria, mas considero que isso a seu irá tempo
irá mudar. Tal como outrora no mercado editorial convencional em
papel houve algo mais que o interesse no lucro, gosto de crer que
também aqui a qualidade irá prevalecer, mas também não sou assim
tão ingénuo para acreditar piamente nisso.
O mundo irá ainda dar
muitas voltas, mas penso não errar ao dizer que se abriu uma caixa
de Pandora quando se tornou tão fácil editar um livro. O tempo o
dirá.
Este texto também foi publicado no blog O Senhor Luvas
Este texto também foi publicado no blog O Senhor Luvas